Era uma vez Eu, Verônica (2012)

Quando se fala em filme nacional, muita gente torce o nariz... e alguns anseiam pelo dia em que algum filme nacional vai ganhar o Oscar, porque só assim, com um atestado de "gringo aprovou" é que começarão a dar valor ao cinema brasileiro. Mas da mesma forma que o cinema hollywoodiano cria pérolas, também filma muita porcaria e isso é normal em todo tipo de cinematografia. A brasileira não seria exceção. Mas no meio de tantos títulos brasileiros, alguns passam despercebidos, e esse filme que trago hoje para falar sobre ele, pouca gente conhece ou nunca ouviu falar. [Pode conter spoiler].


Título Original: Era uma vez Eu, Verônica
Direção/Roteiro: Marcelo Gomes
País de Origem: Brasil
Gênero: Drama
Duração: 91 min
Ano de Lançamento: 2012

O filme conta a história de Verônica (Hermila Guedes), uma jovem médica recém formada que começa a fazer residência em psiquiatria em um hospital público. Ela mora sozinha com o pai Zé Maria (Waldemar José Solha) e namora Gustavo (João Miguel), por quem não sabe dizer o que sente de verdade. Ela gosta de sair com as amigas e ir à praia, o mar é o seu companheiro inseparável, mas apesar de tudo isso, Verônica precisa saber lidar com a doença do pai e lidar com seus próprios medos e questionamentos.

Era uma vez eu, Verônica traz com simplicidade a vida de uma mulher de 24 anos que enfrenta alguns dilemas difíceis em sua vida. Pois, sempre chega uma fase na vida em que ela parece te cobrar coisas. Mas isso tudo é para nos levar à felicidade? Ao som das músicas de Karina Buhr, frevos e MPB, Era uma vez eu, Verônica surge como um grande questionador: o que realmente pode fazer alguém feliz? Um dos questionamentos do filme que define bem os dilemas existenciais vividos pela personagem Verônica é "Se eu não consigo amar, eu tenho um coração de pedra?"
- Acho que eu tenho um coração de pedra.
- Ninguém é perfeito, minha filha.
- Você é um pai perfeito. Tem cheiro de pai perfeito.
Para falar um pouco do filme e da personagem em questão, resolvi dividir a Verônica em duas partes: a Verônica médica e a Verônica mulher. Vale salientar que a partir daqui, podem conter alguns spoilers sobre o filme.

A Verônica médica.

Verônica começa a estagiar em um hospital público como psiquiatra, após passar na prova de residência médica. Como em todo estágio, há um supervisor a quem ela deve submeter seus relatórios e quem, comumente, acha que é o sabe-tudo. Ao longo do filme, Verônica começa a descobrir na prática seu modo particular de consultar seus pacientes. Não existem mais livros e nem professores, são pessoas reais que estão ali, ou seja, não é uma mera simulação.

E é justamente diante dessa situação que Verônica se sente insegura. Afinal, será que todo médico só porque se formou sabe de tudo? A prática é sempre diferente da realidade. Como lidar com isso? Verônica descobre que conversar com seus pacientes não só os ajuda, como também a ajuda nesse processo de adaptação. Ela se envolve com eles e isso torna a sua prática mais humanizada, ou seja, o paciente não é apenas uma ficha para ser examinada. Ao passar pela fila no corredor, Verônica cumprimenta a todos, não só os pacientes como também os funcionários do hospital.

O contato mais próximo com os pacientes fez Verônica ser bastante requisitada no hospital, não só pelos pacientes, como também pelo seu supervisor que a acaba indicando para trabalhar em uma clínica particular. É essa indicação para trabalhar na clínica particular que fará a carreira de Verônica decolar. Esse detalhe fica em aberto no filme, como um dos elementos na nova fase da vida da "nova" Verônica.

A Verônica mulher.

Verônica não vive sua vida centrada no pai. Ela está ali cuidando dele, dando atenção e carinho. Porém, ela vive a sua vida e o pai a incentiva a fazer isso, sempre pedindo para que ela vá à praia para se distrair. A relação entre os dois é bastante interessante, pois não há uma relação de dependência, mas de independência entre os dois.

Verônica é uma mulher independente, que gosta de sair com as amigas e ir à praia. Mas ela está em crise. O sexo em alguns momentos aparece como algo libertador na vida dela, mas é isso mesmo? Enquanto deveria estar fazendo planos para o futuro, como formar uma família ao lado de Gustavo que a ama e quer ficar com ela, Verônica não decide nada. Ela não sabe o que quer ao certo.

Ter tudo e não estar satisfeita. Verônica e seu gravador, companheiro inseparável das aulas do curso de Medicina, passa agora a ser seu confidente fiel. Verônica passa a ser uma de suas pacientes. Analisando a si mesma, ela tenta se conhecer e entender a razão e a origem daquela inquietude e insatisfação.

Seu relacionamento com Gustavo é retratado como algo unilateral. Gustavo faz declarações, diz que a ama, mas Verônica não sente o mesmo. Ela está ali e não está. Numa das cenas do filme, ela se questiona, por que ela só quer sexo?

Verônica não é uma mulher linda ou deslumbrante, ela é uma mulher como qualquer outra. Não é a gostosona escultural de abalar o quarteirão. Ela é apenas uma recifense, com sotaque nordestino, que vive a sua vida tentando se encontrar consigo mesma.


Nessa jornada, Verônica percebe muitas coisas. Pois afinal, o que é a felicidade? É o que as pessoas planejam ou projetam para nós? Verônica é uma personagem bem familiar, ela poderia ser qualquer uma de nós, vivendo as dúvidas, as angústias e os dilemas da vida. Nos encaixamos mesmo nos padrões sociais de mãe, esposa e dona de casa? Verônica não sabe, não tem certeza... e nós temos certeza absoluta de alguma coisa?

Gustavo é o cara certo, o tipo de homem que toda mulher sonha. Mas essa certeza é mesmo real? Verônica se questiona diversas vezes se está tomando as decisões certas. Ela ama Gustavo? É com ele que realmente quer se casar e ter filhos? Ela realmente quer casar? Quer ter filhos? Tem como saber qual caminho nos levará à felicidade plena? Existe esse caminho? Assustadoramente, não existe uma resposta pronta para nós. E é isso que Era uma vez eu, Verônica tenta passar para nós. Tomar decisões sobre o futuro de nossas vidas não é uma tarefa fácil e essas decisões podem trazer consequências que serão terrivelmente drásticas e irremediáveis ou simplesmente positivas e surpreendentes. Só cabe a nós tomarmos essa decisão. Fazer uma escolha e ver se vai dar tudo certo no final. Por essa razão, considero esse filme uma mostra de que independente da idade que tenhamos, os medos e os anseios ainda nos perseguirão.

Nota: ⭐⭐⭐

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